29 setembro 2005

A velha, vermelha em gauche, partida ensanguentada e cadavérica no chão do maleta.

De repente viu cair a moça sua mocidade. Cancerou, apodrecida.

Até que dela tive pena, perder assim-assim o frescor dos poucos anos; motivo nenhum exceto o medo do ridículo. Até compreendo o destino, que arma das suas. Ridícula. Riebeckita, dimorfo de pirolusita, veio sentar-se à mesa. Sem licenciamento. Biriteira, Maria Fernanda Almirante Neta, filha ilegítima de Juscelino, o Kubitschek. Caquética quase nada não podia, deciciosa babejou um "quando nasci", repetiu "quando nasci...", trepetiu, e um anjo veio-lhe à boca dizendo: "Vá, gauche, ser Carlos na vida"... "Vá, disse-me; e fui!". "Foi?" - perguntaram-lhe. Corroborou com um gesto, mais não podia. Esquecera ou desconhecia. "Vá, Carlos..." - ria-se, ela dela. Aí rimos eu, o Stener, o Guilherme e o Antônio, mas este só de regalo. A minoria mostrava acanhamento. "Vá, Carlos, um anjo dess... torr... que vi, vá, me disse; e não é que eu vim?" - gargalhou. Choramos eu e o Stener, de rir. O Guilherme forçou riso e o Antônio não achou graça dessa vez. Os outros sorriram, mas de pena. "Um anjo torto" - disse. Todos olharam, inclusive ela. Satisfez-se. Continuei: "desses que vivem na sombra, disse: Vá, Carlos! Ser gauche na vida." Era desgraçada, ela. Riu de mim, que ria dela. Ria-se em si, por si, de si. Era a graça a desgraçada.
Pediu copo; apreciava álcool. "Tá com cú chêi e vaintorná" - pensei alto. Caíra-lhe a mocidade; tinha razão. Tomou a primeira, foi ficando sem fala. Só tinha o "Vá, Carlos", que eu fizera-nos o favor de roubar-lhe. Perguntou se tinha de pagar, e levantou reconhecendo amizade antiga. Foi-se; deixou-nos a certeza do nunca mais. Estrabulérica.

De repente rebentou-se; não de nascença. Em escorregão deu de nuca na quina da cadeira. Sustive-me, paralisei o riso. Minto. Ri-me, mas só por dentro. Aí minha consciência pesou e mandou-me calar. "Melhor tivesse ido", respondi, "tivesse carloosido".

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